Esta semana um assunto apareceu na mídia de forma ainda discreta, mas já revelando o seu alto potencial polêmico: o surgimento do aplicativo Bang with Friends.
Para quem ainda não sabe o que é, explico rapidamente: este aplicativo identifica e coloca em contato de forma rápida e eficiente pessoas que já se conhecem pelas redes sociais e se interessam em manter entre si apenas um contato sexual no mundo real. Em resumo: sexo casual entre amigos de redes sociais. Só quem fica sabendo dessas intenções são os próprios envolvidos após receberem um e-mail confirmando que houve também interesse do parceiro escolhido. Simples assim, em 15 dias pós-lançamento o aplicativo já obteve a adesão de 500mil usuários.
Não é preciso ser nenhum gênio da sociologia para perceber que este tema dará muito o que falar e será alvo de análises que irão das mais conservadoras às mais liberais possíveis.
Como é dever de qualquer analista ao fazer seu trabalho, será fundamental, no entanto, que se deixem de lado as opiniões pessoais, sempre impregnadas de tendências adquiridas ao longo das experiências de vida de cada um e se coloque num plano de observador, analisando o fato com o devido afastamento que uma abordagem científica preconiza.
Proponho uma visão bastante simples sobre o assunto:
Se voltarmos um pouco no tempo, vamos nos deparar com a primeira revolução sexual que verdadeiramente abalou os alicerces da sociedade: anos 60, geração hippie, a geração paz e amor, tempos de Woodstock e do amor livre.
Nesta época, com a chegada da pílula anticoncepcional o mundo feminino se viu pela primeira vez frente à uma possibilidade de escolha. O livre arbítrio ultrapassava a fronteira da mente e chegava aos limites do corpo. As mulheres puderam decidir e escolher com quem queriam dividir as suas camas, sem as consequências definitivas de uma gravidez indesejada. Isso mudava tudo. Foi revolucionário.
As décadas se passaram e hoje a pílula simplesmente não causa mais nenhuma polêmica,pelo contrário, estranha-se a mulher que não a toma durante sua vida reprodutiva.
Voltando ainda um pouco mais, podemos nos lembrar dos tempos em que as garotas solteiras desfilavam na pracinha da cidade à espera de um rapaz que as escolhesse como possível namorada, do namoro controlado em casa, na frente dos pais, do delicioso espaço de transgressão oferecido pelo escurinho do cinema e tantas outras formas de se iniciar e praticar um relacionamento amoroso. O tempo passa ,os costumes mudam e as pessoas se adaptam com maior ou menor velocidade a eles conforme a própria dinâmica da sociedade em que vivem.
Voltando ao Bang with Friends, o que vemos acontecer hoje, com o lançamento e imediato sucesso deste aplicativo nada mais parece ser do que o curso natural das coisas, num século onde a tecnologia e a velocidade ditam as regras.
Neste século XXI, em tempos de capitalismo informacional, de dromocracia, de valores sociais calcados no mais alto grau de consumismo, uma revolução se instala sob nossos olhos e como todas que surgiram na história, chega com uma força que ninguém mais será capaz de brecar.
O ser humano que nasce neste século, nasce sob o domínio imperioso da velocidade, da visibilidade. A cada dia que passa somos mais vistos online do que off line e tudo acontece no ciberespaço de forma cada vez mais veloz.
Este novo capitalismo impõe o consumo desenfreado de itens tecnológicos e por que não o faria em relação às próprias pessoas e a tudo que as cerca? Tudo é feito para ser consumido rapidamente e descartado após um uso quase imediato e substituído por um novo. Essa é a ideia,essa é a proposta. Ninguém parece estranhar. Assim é o século XXI.
Não cabe, pois, a ninguém, a nenhum de nós, aceitarmos ou nos horrorizarmos diante dessas novas formas de relacionamento amoroso/sexual, em particular a esta proposta do novo aplicativo. Ela, no fundo é coerente com todo o resto que esse novo modelo social nos apresenta.
Podemos, no máximo, adotá-las para nós ou não, numa simples decisão de caráter pessoal. Mais ou menos como aconteceu e acontece com a pílula: toma quem quer.
Tal como se deu nos anos 60 e ao longo de tantas décadas, o start já aconteceu: essas mudanças vieram para ficar, para alterar de forma visceral o modo de ser de uma nova geração. Muito mais do que um simples aplicativo, o Bang with Friends é o insight de uma nova ordem social.
O futuro está muito mais para a música do Titãs: “Só quero saber do que pode dar certo. Não tenho tempo a perder” do que para “Esse cara sou eu” do Roberto Carlos.
Quem viver verá!
Ligia Marques