Em junho de 2007, há pouco mais de cinco anos, o iPhone foi lançado e com ele surgiu um novo e imenso mercado, as apps. Em 2016 estima-se que serão efetuados 66 bilhões de downloads. Usa-se hoje apps para praticamente todas as nossas atividades, que variam de localização de estabelecimentos como postos de gasolina e restaurantes a games, passando, é claro, por apps de apoio aos negócios. É um mercado que em 2012 gerou 120 bilhões de dólares, um valor significativo.
Para os desenvolvedores, ainda existem desafios a serem resolvidos. Um é como gerar dinheiro. Uma parcela imensa dos apps são gratuitos e outra parcela muito grande custa poucos dólares por download, o que faz que praticamente nenhuma das empresas de desenvolvimento de apps sejam milionárias…Outro desafio é como se destacar na multidão. Quando voce soma o portfólio da AppStore com o Google Play temos mais de um milhão de titulos. Como um determinado app vai se destacar neste oceano de apps?
Em minhas atividades profissionais mantenho muito contato com universidades e empresas de desenvolvimento. E, observei que na maioria dos casos os alunos e desenvolvedores não estão focando no alvo certo. Vejo que a ênfase tem sido nos aspectos técnicos com incontáveis debates se a aplicação será nativa ou HTML5 e atenção, é claro, ao tamanho da tela. Mas, um fator que muitas vezes passa desapercebido é a importância do design da aplicação, a experiência que ela passará para o usuário. Uma analogia simples: imagine que sua app é um filme e os usuarios sua platéia. Quantas estrelinhas de avaliação você (ou sua app) receber será quão positiva foi a reação da platéia ao filme ou melhor, à sua app. A experiência deles com a app é que realmente conta.
O foco então deve ser o usuário e sua experiência, mesmo que isso vá contra as expectativas dos executivos que contratam o aplicativo. Suponha que uma empresa queira coletar informações sobre o usuário do app para campanhas de marketing. Esta demanda levará a perguntas desnecessárias à funcionalidade do aplicativo que o usuário terá que responder para usá-lo. O resultado? Ao contrario das expectativas do marketing, que quer conhecer mais seus clientes, os usuarios deixarão de usar o aplicativo. O app será inútil. Simples assim.
O app para ser bem sucedido tem que ser realmente apreciado. Se a experiência do usuário não for um “uau” e sim mera indiferença, o resultado será mais um entre meio bilhão de apps. Isto significa que o app deve preencher com louvor as seguintes caracteristicas:
a) Ser util. A sua funcionalidade deve fazer com que o usuário consiga alcançar plenamente seus objetivos.
b) Ser usável, que é fornecer a funcionalidade da forma mais fácil e intuitiva possivel.
c) Ser desejável. O app bem sucedido é aquele que o usuário faz questão de ter e usar. Isto significa que a experiência de uso terá que ser uma experiencia emocionalmente positiva.
Criar apps é uma experiência nova para muitos desenolvedores porque tem caracteristicas diferentes das aplicações tipicas. Uma app é anywhere, anytime por natureza. Pode e deve ser usado em movimento e sem duvida o smartphone hoje é o objeto que não saimos de casa sem ele…na prática hoje saimos de casa com nossas chaves, com a carteira com os cartões de crédito e débito e o nosso smartphone. Em breve tanto as chaves como os cartões estarão dento do smartphone e ele será o unico objeto que carregaremos para todo canto. Com novas tecnologias surgindo, suportando os nossos próprios sentidos, como visão, audição, olfato, etc (vejam o vídeo abaixo), eles serão um nosso segundo cérebro (não precisamos guardar endereços e nem perguntar onde chegar um local..o app nos mostra como chegar a qualquer lugar), controlaremos nossos objetos e pertences (podemos ligar o ar condicionado da nossa casa antes de chegarmos e nossas plantas avisarão quando precisarem ser regadas), serão nosso assistente pessoal e até mesmo nos ajudarão a cuidar de nós mesmos, analisando nossa pressão, nosso indice glicêmico, nosso Indice de Massa Corporal, se o alimento que vamos consumir ou a água que vamos beber está contaminada com bactérias, etc.
Uma diferença fundamental das apps para as aplicações tradicionais, dos desktops, é o contexto. Uma app não é uma aplicação de teclado e mouse em tela pequena…O contexto permite que a experiência do usuário seja adequada ao ambiente onde ele se encontra a cada momento. Como contexto, não é apenas localização (estar em um restaurante é diferente de estar num ônibus ou metrô em movimento) mas deve incluir também:
- locomoção. Em movimento nossa necessidade pode ser diferente de quando estamos sentados calmamente em um restaurante. Em um aeroporto, por exemplo, estaremos com uma das mãos ocupada empurrando o carrinmho de bagagens e apenas uma estará livre para ser usada. Interfaces de voz serão muito úteis neste caso. A maioria dos smartphones tem sensores que permite o app saber se ele está em movimento e se este movimento é rapido ou devagar.
- Urgência. O usuário gostaria de ter o app certo na hora certa. Urgência é uma dimensão do contexto pouco utilizada. Por exemplo, um app conectado aos sensores de um carro que ativa uma chamada de emergência ao sentir que os airbags foram acionados.
- Intimidade. O seu smartphone você não empresta e nem compartilha. É de uso pessoal e o app pode tirar proveito disso. Por exemplo, uma pessoa que adora fazer compras vai ficar encantada se o app reconhecer que ela está em determinada loja e pela camera ver o produto. Imediatamente alerta o seu usuario dos preços deste produto nas outras lojas das redondezas. Ajuda a pessoa a barganhar!
Mas, como fazer estas apps? Primeiro estamos falando de uma função pouco conhecida no mundo dos desktops teclado-mouse, o UX Designer ou User Experience Designer. Vale pena dar uma olhada no site http://uxdesign.smashingmagazine.com/ para algumas dicas muito interesssantes.
O UX designer deve, para planejar a experiência do usuário, criar uma persona (personagem fictício que vai representar seus usuários), projetar a experiência visando o deleite destas personas e obviamente, por fim, testar o app e a experiência que ele propõe no mundo real.
Para projetar um interface que gere experiência positiva é essencial conhecer quem vai usar o app. Identifique os segmentos de usuários que usarão o app e os personas que representarão estes segmentos. Por exemplo, João é um executivo de meia idade que precisa do app para determinadas atividades. Marina é sua filha adolescente, e tem demandas bem diversas. E Maria, sua esposa, é arredia a tecnologia e portanto não gostaria de se envolver com interfaces meio geeks. Definido o universo de personas, uma pesquisa de campo é muito valiosa. Como na prática estas pessoas usam seus smartphones? Entreviste-os e observe…
A descrição de cada persona é como a descrição de um personagem em um filme. O ator deve conhecer bem o personagem para poder representa-lo ou “vivê-lo” no filme. Assim, descreva com detalhes os personas do app, com nome, foto, descrição do seu dia dia, hábitos, etc. Circule os personas por todos os interessados na criação do app para obter feedback e os use como referência para criar os interfaces. Um bom exemplo de como criar personas está em http://uxmovement.com/wireframes/the-importance-of-tying-personas-to-wireframes/.
Muitas vezes precisamos nos inspirar em apps já existentes. O Dribbble (http://dribbble.com/) é uma boa fonte de inspiração.
Claro, novas tecnologias podem inspirar novos usos e novos designs. Cameras e microfones podem reconhecer individuos pelo rosto e voz, e com isso um app que gerencia agendas pode ajudar o usuario a definir a prioridade de um novo compromisso. Outro exemplo. Voce está em um restaurante, gostou de um vinho e quer comprá-lo? Aponte a camera para o rótulo e ele pode emitir um pedido de compra para algumas garrafas com um simples toque. Um app pode reconhecer o som de choro de seu filho e alertar você se o choro é de manha ou de fome. No futuro, um app com sensor de olfato pode ajudar o médico a reconhecer pelo cheiro qual a doença de um paciente, consultando padrões de cheiro peculiares emitidos por pessoas doentes.
O ponto principal do post é que o app deve ser desenhado para gerar experiencia positiva, o que chamamos “design for emotion”, como em um projeto de um filme. Tem que ser usavel, intuitivo e apresentar bom desempenho. Sim, absolutamente não é um tarefa fácil. Desenvolver apps não é jogo amador.
Finalmente, recomendo a leitura do livro “Built to Love: Creating Products that Captive Customers”, de Peter Boatwright e Jonathan Cagan. Também vale a pena ler “Incrivelmente Simples”, de Ken Segall, que fala da simplicidade como obsessão na Apple e o sucesso do design dos seus produtos. Um do capitulos aborda a questão da “tecnologia com sentimento” e aponta como fator crucial para o sucesso da empresa a remoção da complexidade dos seus produtos e interfaces. Uma boa lição de casa.