Nas maiores consultorias de serviços em gerenciamento de projetos de Tecnologia da Informação do Brasil uma prática prevalece: é a experiência do gerente de projeto que é responsável pela definição correta ou não do prazo do desenvolvimento e entrega de todo o projeto. Muitos desses gerentes de projetos foram promovidos no setor da própria Informática, e graças ao seu passado técnico, tem salvado suas próprias carreiras.
O problema é quando os próprios gerentes de projetos, para salvar suas próprias estimativas de projetos, acabam que atuando como executores e os próprios desenvolvedores de sistemas nos seus respectivos projetos. Lógico que parece e soa bonito isso, ou até heróico, porém, as lições aprendidas não têm sido aplicadas para novos projetos. No final, o projeto pode até sair “bonito na foto”, mas será que a equipe executora aprendeu e será consultada novamente para ajudar ou definir, bem como assumir, suas estimativas de prazo de projeto? Na maioria das vezes não, pois todos irão “debandar” para outros projetos. E todo o conhecimento de estimativa, no caso do Brasil, tem ficado na memória de um gerente de projeto mais técnico-analista-programador do que propriamente numa base de conhecimento corporativa.
Não Podemos Esperar Nove Meses da Gravidez!
A maioria das solicitações e licitações de propostas (RFP) para o desenvolvimento de sistemas no Brasil não chega para as consultorias externas como uma proposta de parceria de longo prazo, mas chega como um pacote que não está explícito, mas significaria o seguinte: “…nós não temos como desenvolver internamente, vamos mandar para alguma grande consultoria que possa assumir a bomba…Daí eles mesmos pagarão os custos de não entenderem direito o que nem nós (contratantes) entendemos”.
Isso acontece porque os próprios tomadores de decisão, patrocinadores ou contratantes, não tiveram tempo para definir um escopo detalhado, logicamente, o que será feito a posteriori. O “abismo negro” se encontra quando a contratante exige um custo e prazo fechado para toda a proposta, que ainda, deveria ser mais aprofundada pela própria contratante. Mas eles não querem correr o risco de ter um contrato sem prazo e custo fechado, eles acreditam que a consultoria iria ficar muito rica com eles.
Qual a razão desta mentalidade ainda prevalecer? Pelo simples fato dos principais contratantes não entenderem a dinâmica e como deveria funcionar o processo de estimativa de atividades, recursos e custos de um projeto.
Exigir de uma consultoria externa algo que nem a própria empresa ainda teve tempo de fazer, e ainda exigir com exatidão custo, prazo e escopo é uma “faca de dois gumes”.
As consultorias que aceitam essas práticas acabam por não “educar” os contratantes, e no médio prazo, acabam prejudicando as consultorias que recusariam essas práticas, e no longo prazo, muitas dessas consultorias que não consideraram devidamente os riscos do projeto acabam falindo suas fábricas de softwares.
Uma das consultorias que eu entrevistei comprovou que o seu principal faturamento vem da alocação de consultores dentro do cliente (off-shore), do que da Fábrica de Software. Muitas fábricas de software dão prejuízo, mas essas são mantidas porque conquistam o cliente pela terceirização da mão de obra. Isso sem falar das centenas de consultorias de informática que faliram nos últimos quinze anos devido essa “prática” indevida aplicada pelas contratantes e aceitas pelas ingênuas consultorias. Essas consultorias estão indo contra o perfeito gerenciamento de projeto, que seria recusar um projeto caso não haja viabilidade econômica, inclusive para quem estará desenvolvendo.
Em algumas empresas contratantes onde encontramos essas fazendo isso, nós sugerimos que elas desmembrassem a atividade de identificação de atividades, fechamento de escopo, daí sim, depois, e outra solicitação de propostas e licitação para quem desenvolveria. Daí, a empresa se sentiu mais segura do que continuar se achando que estaria “entregando seu baú de ouro” para um terceiro.
É que se a empresa contratante acaba querendo ganhar “nas costas” da consultoria, caso a consultoria venha a falir ou não entregar o projeto, todos acabam perdendo. Logo, gerenciamento de projeto é uma arte onde todos devem ganhar.
Eu prometo não te abandonar depois que a criança nascer!
Na verdade, no médio prazo, nas entrevistas que fiz, na maioria dos casos de gravidez, quer dizer, do término de projetos que tiveram essa prática indevida, o “pai” ou a empresa contratante acaba abandonando a consultoria sozinha, sem fundos ou até recusando o filho, quer dizer, o produto do projeto. E ainda, “apontando o dedo” para a consultoria e dizendo: a culpa foi sua que não entendeu direito o que estava escrito na RFP.
A ciência, arte e conhecimento do gerenciamento de Projetos no setor da Informática no Brasil, principalmente em Serviços e consultoria, está sendo salvo por “heróis”. O que eu não sou muito a favor. Não precisamos de heróis, nós precisamos é que todos conheçam o que é realmente cada etapa e exigência para a obtenção de produtos ou serviços de qualidade.
Um patrocinador (stakeholders) consciente ganhará muito mais com projetos de sucesso, bem como as consultorias. O grande problema é quando eles não querem “assumir” algo que é de inteira responsabilidade deles mesmos.
Como as crianças, um projeto terá resultado satisfatório ou feliz proporcionalmente a perfeita relação dos seus owners ou “pais”, se assim eu posso dizer. Todos devem assumir a sua responsabilidade e comprometimento. Temos ótimos programadores e desenvolvedores de sistemas no Brasil. Contudo muitos deles possuem talentos intrínsecos e esforço próprios que os tornam heróis. Se estamos querendo disseminar um real conhecimento do perfeito e dinâmico caminho de gerenciamento de projeto, nós temos que nos unir para “jogar fora” os maus hábitos do passado, e assim, abrir caminho para as melhores práticas, onde essas sejam praticadas com empatia e ética, onde todos possam ganhar.
Eu sugeriria então que o PMI Brasil fizesse um piloto ou uma disseminação nas escolas de Administração de Empresa, Marketing, entre outras, para que uma matéria curta até 100 horas ou algo parecido, onde os estudantes entendessem e aprendessem uma metodologia ou framework de gerenciamento de projeto. A partir daí, quem sabe, a nova geração irá assumir e compartilhar o nascimento de uma gestão eficiente de projetos nas consultorias de informática do Brasil.
Heverton Anunciação
www.heverton.com.br