A frase “quem não se comunica se trumbica” é do eterno apresentador Chacrinha. Ele costumava proferi-la de forma corriqueira e muitas pessoas achavam engraçado essa “tirada” do Velho Guerreiro (como era conhecido). Muitos lembram dele até hoje como “o tiozinho louco que apresentava um programa de TV nos anos 80 na Globo“, porém eu o considero um dos maiores comunicadores da história da televisão brasileira e o motivo é muito simples: ele falava a língua do povo. O que ele dizia as pessoas entendiam, do analfabeto ao mais letrado. O Chacrinha conseguia dar o seu recado de forma simples, didática e direta, fazendo com que a sua audiência fosse uma das maiores da época, entrando em lares da classe A a E.
– “Ok, Chacrinha, apresentador, anos 80… o que isso tem a ver com Gestão de Projetos”?
Nada e ao mesmo tempo tudo. Esse briefing serviu mais para contextualizar a minha intenção em escrever este artigo. Em mais de 8 anos trabalhando com projetos de áreas completamente distintas, uma coisa me parece ser inerente a qualquer projeto, seja ele o mais simples ou o mais complexo – falhas na comunicação. E esse assunto é tão sério e tão importante no dia-a-dia de um profissional em gerenciamento de projetos que eu resolvi escrever este artigo no meu horário de almoço, diretamente do meu Smartphone, só porque uma falha de comunicação acabou de acontecer comigo agora. Mas tudo bem, já tá resolvido e agora posso escrever com calma.
Uma coisa é certa, meu caro colega, não dá pra você trabalhar com gestão de projetos se você não consegue desenvolver suas habilidades de comunicação – e eu não estou falando aqui de saber falar direito com um vasto vocabulário e palavras rebuscadas – eu estou falando no modelo básico de comunicação que, acredite se quiser, muitas pessoas não conhecem ou não fazem uso. Como aprender é viver e relembrar é reviver, abaixo vemos o modelo básico de comunicação que é apresentado no guia PMBoK 5ª Ed (pág. 294):
Modelo Básico de Comunicação. Fonte: Guia PMBoK (5ª Ed).
Notem que não tem muito segredo né? Você é o emissor, através da voz ou da escrita você codifica a mensagem (que não é necessariamente um texto), essa mensagem é transmitida e decodificada pelo receptor, que por sua vez confirma o recebimento e envia ou não feedback.
OBS: O Guia PMBoK traz informações muito genéricas sobre a questão das comunicações em projetos, até porque ele não é um método e sim um padrão de melhores práticas. Por este motivo vou propor uma abordagem um pouco mais “outside” do guia.
Até agora tudo meramente ilustrativo, não há muito terror nisso. Então qual seria o grande problema? O problema é que muitos profissionais foram doutrinados a acreditarem no trabalho de gestão apenas com técnicas e ferramentas clássicas como gráfico de Gantt e Análise de Valor Agregado, priorizando escopo, custo e cronograma e jogando para segundo plano as comunicações. Vou mostrar aqui 3 exemplos clássicos de comunicações em projetos e como é importante você, que é GP por exemplo, atuar de forma coerente e proativa em cada um deles.
REUNIÕES COM AS PARTES INTERESSADAS
Acha reunião algo chato? Deixa eu te confessar um coisa, dependendo do assunto e da condução da reunião, eu também acho. Gosto de mais reuniões ágeis e menos reuniões formais, mas vamos ao que interessa. Opa, espera um pouco! Antes de qualquer coisa, vamos relembrar que componentes são importantes em uma reunião formal. Qual a primeira coisa que devemos fazer? Depende! Se foi você quem marcou a reunião, procure colocar no convite a pauta que será discutida (de preferência com poucos assuntos para torná-la mais dinâmica). Envie o convite com o maior tempo de antecedência possível (geralmente esse tempo é determinado no Plano de Comunicação do Projeto). Procure ser pontual e determinar um tempo de discussão para cada tópico. Feito isso, vamos aos trâmites. Procure ser transparente com tudo que está acontecendo no projeto, dê um overview da evolução e dos principais problemas encontrados. Saiba ouvir mais do que falar, muitíssimo importante isso. As reuniões são cerimônias usualmente caracterizadas por transformar o GP em sparring, portanto é a hora de você mostrar toda a sua Inteligência Emocional e não se deixar levar pelas críticas. Procure não ser reativo com os seus interlocutores, porém se posicione firmemente no que você realmente tem certeza. Nem sempre o cliente tem razão e demonstrações constantes de fraqueza podem ser nocivas a você ao longo do tempo.
ENVIO DE STATUS REPORT
Diário? Semanal? Mensal? Independente da periodicidade de confecção e envio, uma coisa é mandatória ENVIE! O Status Report (ou qualquer que seja o nome que se tenha dado ao documento com informações sobre a evolução do projeto) deve ser enviado às partes interessadas indicadas no Plano de Comunicação. Muito importante que ele tenha um layout simples e de fácil entendimento, onde as informações realmente relevantes referentes ao projeto sejam dispostas de forma clara. Se você pensa que preencher o documento com centenas de gráficos é ser eficiente na comunicação, pode estar cometendo um erro grave. Tem muitos Gerentes de Projetos que costumam “encher linguiça” com informação irrelevante e redundante apenas para tentar impressionar às partes interessadas. Conselho: isso é perda de tempo! Independente de como você vai construir o layout do Status Report, este segue uma premissa fundamental: não se omite informações em hipótese alguma. Sou muito insistente com isso – a relação entre o Gerente do Projeto e as partes interessadas precisa ser transparente – porém preciso explicar uma coisa (já que tem gente que não entende): ser transparente não é ser negligente com sua organização. Se o projeto não prevê transferência de tecnologia, por exemplo, você não vai sair por aí expondo o que é vedado no seu contrato de trabalho e na sua conduta ética, certo?
TROCA DE E-MAILS
Este é um tópico muito importante e não foi a toa que o deixei por último. Você não tem noção do impacto que uma simples troca de e-mail (a considerar o conteúdo) pode ocasionar ao projeto e até mesmo a sua permanência no emprego. A comunicação formal escrita é a que talvez provoque a maior quantidade de ruídos, se considerarmos o modelo básico de comunicação. Isso se explica porque o e-mail é algo muito frio, aberto a interpretações e dependendo da forma como é escrito e do humor de quem recebe, pode ser muito mal interpretado. Quem aqui nunca recebeu algum e-mail “malcriado” com palavras duras e conteúdo muitas vezes incoerente com a realidade? Acredito que todos nós. Só que muitos profissionais costumam responder a esses e-mails de forma intempestiva e sem avaliar o impacto dessa resposta. Aí está outra grande falha na comunicação e pra essa eu tenho algumas dicas pra dar:
- Avalie as pessoas que estão copiadas no e-mail e, dependendo do grau de influência e interesse no projeto, não o responda de imediato.
- Não transforme o e-mail em um chat (é sério). Se há muitas pessoas copiadas, uma boa pedida é uma comunicação informal (de preferência uma ligação telefônica ou uma conversa presencial) antes de responder o e-mail. Dadas as explicações e tratativas, responda a este e-mail a título de formalização do que foi discutido e acertado nessas conversas.
- Se não há como se comprometer com o que foi solicitado, não responda o e-mail antes de ter certeza disso. Todo o que você coloca no e-mail tem valor de documento, é como se você estivesse assinando um contrato. Só se comprometa com o que pode cumprir.
- É prudente avaliar todas as partes interessadas antes de enviar ou responder um e-mail. Dependendo do assunto abordado, pessoas com cargos decisórios como diretores e CEOs não precisam ser copiados em assuntos corriqueiros.
- Eu sempre falo uma frase pra todos que trabalham em minha equipe de projeto: e-mail não resolve, apenas formaliza. Se você quer que alguém resolva algo de forma rápida, é prudente conversar informalmente antes e depois (caso necessário) formalizar.
Faz sentido pra você o que foi exposto acima? Deu pra notar como é importante fazer uma boa gestão das comunicações em seus projetos? Entendeu agora porque a comunicação precisa ser clara com as partes interessadas no projeto? Ficou claro que um Gerente de Projetos precisa ter suas habilidades humanas (Inteligência Emocional e bom relacionamento interpessoal) bem desenvolvidas? Então realmente o Chacrinha tinha toda razão quando o assunto era comunicação. Pra tudo na vida é importante saber se comunicar bem e gerenciamento de projetos não foge à regra.