Era um clarão do verão brasileiro. Aquele que ofusca a vista e quase que pede um olhar soslaio. Todos juntos a caminharem para aproveitar o dia da melhor forma possível. Pois ninguém tinha certeza se outro dia haveria. Os animais estavam lá em seu horário de almoço a comerem o milho, na verdade era massarouca aquele pronto para uma pamonha, mas que ninguém se arriscava em isso falar, estavam ocupados com mastigação. Há sempre alguém a se assustar quando o silêncio toma conta do ambiente. Ali o silêncio era assustador, embora pudesse se ouvir o mascar das vacas e touros. O bezerrinho inquieto e assustado começou a falar sem graça, sua voz insistia em não sair. Estava sem entusiasmo também, a sua boca ocupada, lutou contra ele mesmo para pronunciar as palavras:
“O milho não é perene, é? Só dá para uma safra para nunca mais. É gostoso…”.
“Ele grita tremendamente, acaba estourando e em seguida estabelece um silêncio. É assim mesmo o milho de pipoca é barulhento, se em contato com o fogo”, completou o vitelo.
A manada ignorou a tentativa de discurso da bezerrada. Antes mesmo de o sol virar para o oeste, apareceu um Tigre assustado para selecionar os touros para labuta em regime extraordinário.
“Hoje precisamos carregar a soja para exportação, o navio está atracado aguardando a carga, ninguém vai para casa antes de terminar o serviço”.
Ele era líder do grupo, tinha que coordenar as atividades de exportação da soja para o além-mar. Não aceitava pestanejação, a não ser que o touro quisesse virar janta do Leão, chefe mor. Era experto o suficiente para não desejar ser refeição. Seu desejo estava por se realizar, viajar. Isso só aconteceria na aposentadoria. Os animais pararam de mastigar. O silêncio reinou novamente.
“Tudo bem! Darei a vocês uma recompensa por todo esse esforço. Que tal um descanso triplo, vocês terão três dias de descanso ”, concluiu o Tigre num tom misto de democracia e intimação, como se alguém pudesse dizer que não quer trabalhar. Essa opção não existia, embora parecesse. Era ordem mesmo lá de cima, como gostava de dizer para selar a necessidade de participar.
A noite parecia ter chegado para aquela espécie. O sol que se fazia deitar nas costas era lua naquele momento. O clima mudou drasticamente, nem o novilho que gritava para mamar foi suficiente. Pareciam desprovidos de audição. Ninguém tinha chance de curtir o silêncio, o ar fresco que soprava se transformara em bafo quente.
“Hoje tenho compromisso”, argumentou o Touro marrom.
“Hoje é aniversário dela minha…”, comentou outro, sem vontade de fazer-se entender.
“Pois é, colegas. Vocês tinham todos esses compromissos, sei… Agora há um compromisso muito maior, que é carregar a soja.” Ordenou o Tigre em tom ameaçador.
Um mosquito atrevido posou sobre o nariz do Touro Cinzento, sugando-o. Ele despertou atordoado, deu meia volta roçando sobre a árvore. Tropeçou, perdeu o equilíbrio e tombou, cai escandalosamente. Seus olhos pareciam desgostados, a lingua à vista. Começou a escutar vozes infinitas de bezerros e vacas, sem mesmo saber a procedência. O zumbido aumentava, ouvia vozes que diziam “seja bem vindo, papai. Nós amamos você”. Concentrou-se. Gostou. O Tigre não perdeu tempo chutou o Touro, dizendo.
“Cada fera que me aparece, levanta-te e mãos a obra. Daqui ninguém sai enquanto não terminar. Ai de quem ousar desobedecer… Estará jogando fora a sua empregabilidade.”
Um olhar furioso se vez presente, mas imediatamente empenharam-se em executar a tarefa, sob a chuva dos falares e murmúrios do Tigre que, a qualquer custo, queria ver a soja embarcada para além-mar.
O carregamento terminou às cinco horas da manhã. No dia seguinte alguém queria usufruir os três dias que foram prometidos. Foi então que a voz do Tigre sumiu. Ficou quieto como uma criança em fase de observação para aquisição da linguagem. Não houve que o fizesse falar. A tourada se reuniu exigindo, entretanto o Tigre desapareceu sem dizer adeusinho, imitando as nuvens.
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12:46:56 pm
vc andou lendo aquele livro estranho que a fuvest pede no vestibular né? hehehehehe…