A colaboração não é uma ação, atitude ou comportamento. Nem surge de uma intencionalidade, necessidade ou princípio ético. A colaboração é uma dinâmica intrínseca à auto-regulagem dos sistemas sociais humanos.
Todo sistema social humano pode ser chamado assim porque os humanos que o integram conservam seu viver conservando sua integração com o sistema, e conservam o sistema porque ele surge a partir da conservação do viver de cada um em acoplamento estrutural a este sistema. Ou seja, sistemas humanos são sociais apenas nos contextos onde o viver do outro é tão válido para alguém como é o seu próprio viver.
Não estou indicando uma utopia, apenas relembro de que modo nos constituímos como humanos em nossos nichos primatas, tribais e depois matrízticos, durante milhares de milhares de anos. A conservação do núcleo fundamental de nossa espécie, onde os filhotes eram cuidados, os alimentos eram colhidos e repartidos por todos, as interações eram carinhosas e o coito era uma possibilidade constante, veio a nos constituir como humanos que somos, imersos na linguagem.
Essa perspectiva que traz o homem como um ser constitutivamente co-operativo, capaz de manter coordenações de coordenações mesmo tendo um sistema nervoso fechado, pode parecer idealizada demais, principalmente quando olhamos ao nosso redor nos dias de hoje, mas vale lembrar que é muito recente em nossa história a impessoalidade no submetimento de outros homens, data de no máximo quarenta mil anos.
Não pretendo resgatar aqui toda a epigênese civilizatória que nos trouxe até esta configuração de Homus Arrogans, mas gostaria de lembrar que basta reunir algumas pessoas, principalmente jovens e crianças (desde que criados como humanos), em uma situação sem tensão ou exigências, para vermos emergir comportamentos de amizade, alegria e bem-estar.
Entretanto, considerando os cenários altamente competitivos das instituições das quais fazemos parte (empresas, escolas, igrejas, esportes, etc), a criação de contextos, espaços e oportunidades de encontro humano livre e autêntico, exige abordagens estruturadas, planejamento adequado e conhecimentos sofisticados.
A transição das estruturas hierárquicas pautadas pelo comando-e-controle, para as matrizes reticulares, auto-reguladas pela livre expressão dos indivíduos, exige algum tipo de abordagem estruturada. Talvez aí possamos falar em inteligência colaborativa, não como uma valor a ser desenvolvido em grupos humanos, mas como uma linha de ação que venha reconfigurar o uso do tempo, dos espaços e dos acessos entre as pessoas de modo a resgatar seus fluxos de convivência co-inspirativos.
Dizendo de outro modo, a assim chamada inteligência colaborativa pode ser entendida como um conjunto de estratégias que venham a promover a reconfiguração das estruturas hierárquicas de uma organização, na abertura de oportunidades adequadas e possíveis, para que as pessoas possam apenas fluir o que já é inato ao ser humano, a colaboração.
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