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Por que o governo brasileiro não dá preferência ao software nacional?

publicado por Gérson Schmitt

Figura - Por que o governo brasileiro não dá preferência ao software nacional?As compras eletrônicas se consolidaram como um excelente instrumento de governança, transparência e economia para a administração pública no Brasil. Presente no país desde o final da década de 90, esse instrumento gerou o desenvolvimento de grandes projetos referenciais e colocou o Brasil, em 2002, como líder na América Latina e na 18ª posição do ranking mundial da ONU em e-government.

Foi nesse período, quando a internet começou a se tornar um canal imprescindível de comunicação, prestação de serviços e negociação, que a população começou a ter acesso a serviços que antes seriam impossíveis, como a votação eletrônica, acesso aos formulários eletrônicos para Declaração do Imposto de Renda e integração do banco de dados do Sistema Único de Saúde (SUS). Esse movimento também trazia a possibilidade de crescimento das empresas brasileiras de software e serviços de TI e também de alçarem projetos internacionais de e-gov.

De todas inovações daquele período, as compras eletrônicas do setor público, iniciadas com o lançamento da BEC- Bolsa Eletrônica de São Paulo, em 2000, seguida por inúmeros outros portais de compras públicas que a sucederam, trouxeram ganhos significativos, especialmente pelo uso do pregão eletrônico regulamentado em 2002.

Apesar da grande evolução nesse segmento, há ainda ajustes importantes a serem feitos na legislação e modelos de operação. Distorções como a atuação do portal do Banco do Brasil, o Licitações-e, que limita o acesso de fornecedores aos processos de compras públicas apenas para aqueles que são seus correntistas – exigindo ainda o pagamento de taxas de serviço, prejudicando, em especial, as MPE (micro e pequenas empresas) – são um flagrante desrespeito à legislação vigente, já denunciado pelas principais entidades representativas do setor de TI, durante evento público promovido pelo TCU, em 2012.

Os investimentos em e-gov dos primeiros anos da virada do milênio não tiveram a mesma intensidade ao longo daquela década nem na seguinte, quando o país passou a dar prioridade ao software livre e tirou o foco da inovação e do fortalecimento do software nacional. Essa ação estratégica desastrosa impediu o país de acompanhar a evolução da tecnologia para e-gov, levando o Brasil a decadente 59ª posição no último ranking mundial de e-gov da ONU, divulgado em 2014, com dados de 2012. Essa situação também vem corroborando para o país despencar nos indicadores mundiais de competitividade.

As diretrizes equivocadas, que mantêm o país em um cenário dissonante com a evolução econômica digital, retiram ou atrasam muito a possiblidade de ser mais competitivo e de ampliar o desenvolvimento da Indústria Brasileira de Software e Serviços (IBSS). Boa parte da deterioração desse cenário pode ser explicada pelas duas principais políticas ou modelos que retiram valor do potencial de inovação e ganho de produtividade que pode trazer o setor de TI para o país: o governo prioriza o software livre, deixando de apoiar de forma decisiva o software nacional e assume o papel de maior concorrente e empregador setorial, com grandes equipes em empresas estatais, o que também já ocorre em governos estaduais. De acordo com o site da ABEP (Associação Brasileira de Entidades Estaduais de TIC), as 27 entidades federativas do país têm empresas de TI de grande porte.

O incentivo ao uso do software livre, com códigos abertos, em detrimento do desenvolvimento do software nacional, vem deixando de lado milhares de boas soluções brasileiras de e-gov que poderiam gerar casos de sucesso no Brasil e exportações. Mesmo com todo apoio do governo desde 2002, o segmento de software livre representa apenas algo em torno de 6% no atendimento ao mercado brasileiro de software.

Outra ação que gera impactos negativos no desenvolvimento do mercado de tecnologia nacional de e-gov está na preferência do governo pela compra de serviços em detrimento de software como solução. Essa escolha gera implementações caras, de longa duração e de alto risco de insucesso, muitas vezes com baixa qualidade e sem um plano de evolução.  Ainda estimula ou fomenta um modelo que “comoditiza” um setor de alta tecnologia. Esse modelo pode ser bom para a Índia, mas para o Brasil, onde faltam mais de 100 mil profissionais qualificados de TI e plataformas de software padrão world class, vem gerando déficits crescentes na balança comercial que já ultrapassam USD 7 bilhões por ano.

Ainda temos visto o governo apoiando programas direcionados e discriminatórios como o Portal do Software Público, que aceita apenas registro de software livre. Essa ação agrava-se pelo fato do governo atuar como um broker que apresenta um catálogo eletrônico com ofertas para e-gov, criando um canal de venda para poucas empresas privilegiadas, prejudicando ainda mais as empresas de software nacional de e-gov com propriedade intelectual protegida. A quem interesse essa limitação de concorrência?

Toda essa movimentação considerada prejudicial à Indústria Brasileira de Software e Serviços, associada ao equivocado foco e fomento à exportação de serviços como commodities, comercializados pelo melhor custo homem/hora, fortalecendo o processo de “colonização tecnológica do Brasil”, colocam o país muito abaixo dos países desenvolvidos e emergentes nos indicadores mundiais de e-gov e TIC com papel apenas coadjuvante.

Para reverter esse cenário, o governo precisaria avaliar sua preferência por compra de serviços e software livre para priorizar o fomento ao qualificado software nacional, incumbindo-o do papel de gerar inovações em e-gov e em TI, respeitando a propriedade intelectual das empresas. Essas mudanças trariam um novo período de evolução de serviços e relacionamento com cidadãos e organizações – modelo com o qual Brasil conquistou visibilidade global nos primeiros anos do novo século, quando existiam um ambiente e momento de entusiasmo com a vanguarda em e-gov cada vez mais distante.

[Crédito da Imagem: Software Nacional – ShutterStock]

Autor

Gérson Schmitt contribuiu no Livro “COMPRAS PÚBLICAS BRASIL”, da autora Florência Ferrer, lançado em maio/2015 durante o VIII CONGRESSO CONSAD DE GESTÃO PÚBLICA, em Brasília.

Gérson Schmitt

Comentários

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  • Inovação no Brasil? Piada muito ruim. Brasil só inventa propaganda, e quase sempre, de cerveja, ou de alguma forma com conotação sexual.

    Começa com os sistemas operacionais. [Praticamente] Só Windows. Linguagem usada para serviços Web? ASP.NET + C#. Servidor Web? IIS. Gerenciador (servidor) de emails? Microsoft Exchange. Cliente de Emails? Outlook. Navegador? Até um tempo atrás, era o IE (Internet Explorer), mas perdeu para o Google Chrome (no Brasil).

    Isso sem contar as empresas que vendem software. São todas de estrangeiros; mesmo que criadas aqui, se derem lucro, foram compradas por não-brasileiros.

    Empresas de TIC (infraestrutura) são todas estrangeiras: Vivo, Claro, Oi, Net, Embratel (empresas com ações na bolsa ou não) e TIM.

    Anti-vírus/Firewall? AVG, Symantec, Avira, Avast, McAfee.

    Computadores montados? HP, Dell, Lenovo, Semp Toshiba… Positivo? pfff, nem de perto lider de mercado.

    Impressoras? HP, Lexmark, etc…

    Infra de redes? Cisco, Juniper, MicroTik, TP-LINK, D-LINK.

    Fábrica da Apple no Brasil? Sai mais barato importar!

    Firmwares de celulares? Já se foi o Symbian, temos Windows Phone, Android (Google domina o mercado) e iOS.

    Isso tudo dos equipamentos mais vendidos, e o resto nem se fala.

    Ah, e redes sociais? Orkut, Facebook, MySpace, Google+, WHATSAPP, etc.

    Onde está inovação? Todos os produtos que usamos são estrangeiros. Quando você compra toda a infra de estrangeiros, você fica refém deles, pois são eles que sabem como funcionam as coisas e portanto os melhores softwares são deles.

    Nem vou falar do excesso de incompetentes que as faculdades estão formando e entram nesse mercado todos os anos, muitos dos quais estão tirando vagas dos que sabem alguma coisa e diminuindo a capacidade de produzir das empresas que para sobreviverem precisam se vender para os estrangeiros.

    Ah, e para finalizar: perceberam que é cada vez mais exigido que se saiba línguas estrangeiras pelas empresas (inglês, Espanhol, Francês, Alemão, etc)? Simples: de gerente pra cima, são todos de outros países (pelo menos da diretoria pra cima) enquanto que para se escrever um sistema não se necessita de tudo isso, e para ler livros basta só um inglês técnico razoável, o resto tio Google ajuda.

    Porque vocês acham que a NSA leu os emails da Dilma e companhia? E porque vocês acham que companhias como TIM e Claro estão cometendo um crime, indo contra o Marco Civil da Internet e estão “dando acesso gratuito” às redes sociais como Facebook?

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