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Carreira: O difícil momento da demissão

publicado por Israel Bovolini Jr

Vamos falar a sério.

Hoje não temos nenhuma análise de filme, nenhuma piadinha, nenhuma comparação engraçadinha. Vamos falar de uma situação bastante desagradável pra todos os envolvidos: o momento da demissão.

Se você é um gestor que teve que passar pela situação de demitir um funcionário, meu respeito e comiseração. Como você olha nos olhos daquela pessoa que durante algum tempo te ajudou, te prejudicou, brigou e sorriu com você e diz “Fulano, esta empresa não precisa mais de você?”. Difícil, pra dizer o mínimo. No fundo, nenhum funcionário pede ou cava a demissão por causa da empresa, ele quase sempre vai pedir ou cavar a demissão por causa do gestor. Por pior que a empresa seja, existem maneiras do gestor contornar as situações em favor do funcionário, mas isso dá um trabalho danado. No curto prazo, realmente é mais fácil deixar a coisa acontecer. Mas quase todo mundo esquece que uma avalanche começa com meia-dúzia de flocos de neve que se deslocam pra onde não deviam.

Se você é um funcionário que já foi demitido (e quem nunca foi?), conhece no momento da demissão o verdadeiro sentido da expressão “velocidade do pensamento”. Durante aqueles 3 segundos em que você ouve a frase “você está demitido” passam pela sua cabeça suas dívidas, sua família (se você tiver), seu status, sua vida inteira. É o momento da morte sem o alívio da consumação. É o momento em que você sabe que está morto, mas no dia seguinte vai ter que levantar pra encarar a situação. Mas acho que a pior sensação de todas é a de que você fracassou. E essa sensação acontece mesmo com aqueles que cavaram a demissão. A não ser que você seja desprovido de qualquer moral ou amor-próprio, no momento em que a frase fatídica é proferida você se sente a sombra do cocô da mosca do cavalo do bandido. Você acha que até aquela lama que fica entre a calçada e a rua tem mais dignidade ou competência que você.

Este momento é bastante difícil tanto para o gestor quando para o funcionário, mas existem algumas atitudes que podem ATENUAR a sensação ruim. Entenda que cada caso é um caso, mas algumas linhas-guia podem te ajudar. Como sempre, não tenho a pretensão de ser o dono da verdade, mas já estive dos dois lados desta moeda, e (como todo mundo) gostaria que as coisas fossem feitas de um modo melhor. São elas:

Para o GESTOR

1 – A DECISÃO: Esteja seguro de que a decisão é a mais correta. Uma vez feito o comunicado, não dá pra dar um tapa nas costas do funcionário e dizer “primeiro-de-abril”. ANTES de chegar ao ponto de demitir um funcionário, pense friamente se ele não merece mais uma chance, se ele ainda tem aquele potencial que você enxergou antes. Se você não conseguir responder à pergunta “o que ele ainda tem pra oferecer?”, é um bom indício de que chegou a hora do fim.

2 – A SURPRESA: NUNCA, JAMAIS, EM HIPÓTESE ALGUMA, NEVER (espero que esteja claro) pegue o funcionário de surpresa. A chance dele responder com violência (verbal ou física) é grande. Existem pesquisas que dizem que o processo de demissão deve começar 3 meses antes do momento em si. Chame para reuniões, explique o que acontece, por que o funcionário não está entregando o que deveria, estabeleça metas e métricas para melhorar o desempenho do funcionário. A não ser que ele seja uma ameba esquizofrênica – ou pior, esteja em campanha para ser demitido – ele vai mudar de atitude.

3 – As PONTAS SOLTAS: Prepare a documentação necessária para a demissão ANTES do momento. Procure cobrir as lacunas necessárias para evitar um processo trabalhista. Acima de tudo, tenha documentos que comprovem sua decisão, como avaliações de desempenho, relatórios de faltas, etc. Por mais que a empresa não tenha esses processos, nada impede você de organizar o seu.

4 – A SAÍDA: Entenda que mesmo que o funcionário não pergunte, existe uma série de medidas práticas a serem tomadas na decisão. Antecipe-se às dúvidas e providencie informações tipo: último salário, equipamentos que estão com ele, se ele fica até o final do dia, o que a empresa vai (se vai) oferecer a ele, transporte caso ele dependa de fretado, essas coisas. Isso agiliza e atenua o processo. E ACIMA DE TUDO, seja COERENTE com o que prometer. Se você não sabe se vai fornecer uma carta de recomendação, não prometa.

5 – A SEGURANÇA: Não estamos desconfiando de ninguém, mas seguro morreu de velho. No dia anterior à comunicação, faça um backup da máquina e dos acessos de rede do funcionário. Não sabemos como ele vai reagir, e a propriedade intelectual saiu de uma cabeça que não estará mais disponível no dia seguinte.

6 – A PRESUNÇÃO: Você pode ter trabalhado com a pessoa durante os últimos 20 anos, e vivido as mais diversas crises. Mas essa é uma situação nova, e você não sabe como ele vai reagir. Não seja presunçoso achando que se fizer as coisas de qualquer jeito vai dar certo porque a pessoa é sua amiga. Normalmente acontece o contrário.

7 – A ATITUDE: Não encarregue ninguém de demitir a pessoa. Não coloque essa nas costas do RH. Faça você mesmo. É uma questão de respeito.

8 – A DATA: Faça a demissão preferencialmente no começo da semana. A equipe terá tempo de absorver, o funcionário vai ter tempo de se planejar, e você vai ter tempo de contornar eventuais problemas. Não deixe as pessoas ruminando no final de semana.

9 – O LOCAL: Demissão é um assunto delicado, então não faça isso a portas abertas gritando aos quatro ventos. Proteja a você e a seu futuro ex-funcionário fazendo isso em um local fechado e não-visível para quem estiver passando. E sempre peça para alguém do RH te acompanhar para esclarecer dúvidas de processo, mas lembre-se: a comunicação tem que sair de você.

10 – A COMUNICAÇÃO: Chame o funcionário para o local de maneira natural. Não faça brincadeiras nem pareça sério demais. Isso cria falsas expectativas. Durante a reunião, seja educado, coerente e cordial, você não sabe se vai encontrar este profissional no futuro. Seja claro nas explicações do porquê do funcionário ser demitido – por isso reúna documentos que comprovem a decisão (análise de performance, etc) – mas não se prolongue. Quanto mais tempo vocês conversarem, maior a probabilidade de virar discussão, e a decisão já está tomada. Em raríssimos casos o funcionário assume uma postura aberta, perguntando o que ele poderia melhorar, e nesse caso a atitude mais segura é conversar um pouco sobre isso. Acima de tudo, não peça desculpas e não justifique demais, se você quiser que ele tenha respeito por você. JAMAIS comece com “Desculpe”, “Sinto muito”, “Não queria ter que fazer isso” e similares, porque passam a imagem de que a decisão não está bem estabelecida. Seja paciente, porque a palavra “demissão” causa desorientação, e você pode ter que explicar as coisas mais de uma vez. É difícil pra você, mas é mais difícil pra ele. Em caso de resposta violenta, não reaja. Existe a segurança da empresa e a polícia pra resolverem isso.

Para o FUNCIONÁRIO

1 – A ATITUDE: Você foi demitido. Encare isso como um fato, e não como uma projeção de sentimentos. Existe algo que você precisava ter feito e que não fez (nem que fosse puxar o saco do chefe). Quero crer que se você foi demitido isso foi uma consequência de desempenho, e não como uma campanha para receber os direitos trabalhistas. Se esse for o caso, você não merece muito respeito. “Ah, mas eu não aguentava mais essa <coloque um palavrão aqui> de empresa, eles tem que pagar!” – então tivesse tido a hombridade (serve pra mulher também) de pedir demissão. Seria mais justo e honrado. Já se você foi demitido por causa de desempenho, a atitude mais certa seria repensar sua carreira. Encare a demissão como uma forma de sair da acomodação (um pé na bunda pode ser bom porque te empurra pra frente, vale lembrar) e de fazer as coisas de maneira diferente. Tenha a seriedade de encarar a demissão de frente, isso ajuda a atenuar a sensação de incompetência. Pode ser que você foi demitido porque seu gestor tem medo de você – e isso acontece. Já parou pra pensar que, se a empresa colocou alguém acima de você, esse alguém tem – ou demonstra – algo que você não tem? Use esse tempo para desenvolver as habilidades que levaram seu ex-gestor a ser promovido.

2 – A SURPRESA: A não ser que seu gestor seja um tremendo demagogo – ou sem-noção -, ele vai te dar indícios de que seu desempenho está fraco. Portanto, encare que a demissão é uma possibilidade concreta. Isso ajuda a diminuir a surpresa. Pense que a empresa investiu tempo e dinheiro em te treinar, e vai entregar isso de mão beijada para outra empresa qualquer, então ela não vai querer te perder a não ser que você prove que o investimento dela foi furado. E, sejamos francos: se a empresa não presta mesmo, por que você ainda está nela? O bom profissional dificilmente fica parado, todo dia vemos uma notícia dizendo que falta mão-de-obra qualificada em nosso meio. Seja profissional e peça demissão, não deixe que o time caia por sua causa. E se você conseguiu responder a questão que eu propus, porque você não encara sua rotina de outra maneira? Talvez a empresa seja ruim, mas que atitudes suas podem fazer ela melhorar? É, eu sei, dá trabalho. Mas pra quem não sabe jogar bem até a bola atrapalha.

3 – A ROTINA: Você vai ficar um tempo em casa, nem que sejam dois dias. Organize-se para começar a busca de um novo emprego, resista à tentação de acordar todos os dias às 10 (tá bom, durante um período CURTO isso ajuda). Como normalmente recebemos um bom dinheiro ao sermos demitidos, temos a tendência de ficarmos ociosos. Acorde cedo, faça uma atividade física – é comprovado clinicamente que exercício é a melhor forma de combater depressão. Estabeleça objetivos para casa como se fossem do seu trabalho – lavar a louça, varrer a casa, etc. Isso te ajuda a não perder o gás entre um trabalho e outro.

4 – O DINHEIRO: Você não sabe quanto tempo vai ficar em casa. Nessa hora vale o conselho do vovô: poupe. A sua entrada parou, mas as dívidas não. Refaça (ou comece) seu orçamento doméstico para que o dinheiro não falte (muito).

5 – A TRISTEZA: Conta-se que, ao ser rejeitado por um time pela primeira vez, Michael “Air” Jordan – é, o do Chicago Bulls – trancou-se no seu quarto e ficou remoendo a tristeza por 18 horas seguidas. Isso permitiu que ele encarasse a rejeição de forma objetiva, e se sentisse tão mal com ela que isso o ajudou a criar uma casca para a próxima rejeição. Permita-se sentir o luto da perda de emprego, mas não pare na tristeza. O mundo ainda não acabou.

6 – O DESENVOLVIMENTO: Sim, você agora tem tempo livre. APROVEITE. Agora você tem tempo para fazer um curso, colocar sua leitura em dia, e trabalhar aquelas habilidades que estão adormecidas – ou que você estava muito ocupado pra perceber.

7 – A REDE: Hora de reatar contatos. É do senso comum a idéia de que não importa saber, mas ter o telefone de quem sabe. Coloque sua rede de contatos para trabalhar contigo, e sua recolocação vai ocorrer mais cedo do que pensa. Não tem rede de contatos? A não ser que você seja um náufrago – e até um náufrago tem o Wilson – você deve ter relacionamentos. Se não tiver, hora de começar.

8 – A BAGAGEM: Na hora de uma nova entrevista, NUNCA, POR NADA DESTE MUNDO, NEVER, NEM QUE A VACA TUSSA fale mal da sua antiga empresa. O entrevistador vai pensar mais ou menos isso: “se ele está falando mal da empresa anterior, ele não vai se dedicar muito nessa, esse aí está revoltadinho”, e necas de emprego pra você. Foque nas habilidades que você adquiriu, nos contatos e projetos que você conquistou, somente aspectos positivos. Por mais que a saída tenha sido doída.

9 – A SEQUÊNCIA: Você não vai voltar pro emprego anterior, a não ser por alguma circunstância acima do seu controle. Então, hora de fazer planos para o próximo: se você é um excelente técnico, por que não tentar desenvolver suas habilidades gerenciais? Ou seu plano de marketing pessoal? Na próxima entrevista o selecionador vai querer sentir confiança, e estabelecer objetivos para a próxima colocação vai te ajudar a passar esta sensação.

10 – A COMUNICAÇÃO: Ninguém tem sangue de barata (espero), então o momento de ouvir a frase “você está demitido” VAI doer. Não conheço ninguém que tenha ficado feliz neste momento. Então, você pode sentir algumas destas emoções: tristeza, raiva, ódio, fúria, ansiedade, sensação de incompetência, revolta, enfim, nada de bom. Por mais tentador que seja esmurrar aquele energúmeno (ao dicionário) que está na sua frente, NÃO PERCA A RAZÃO. Violência verbal e física são passíveis de punição, e só vão te prejudicar no futuro. Você por acaso sabe se o gestor que te demitiu não vai te encontrar em outra empresa? Eu costumo utilizar a frase “sempre use palavras doces e macias, você nunca sabe quando vai ter que engoli-las”. Por mais que você sinta o desejo assassino, CONTENHA-SE. Ao invés da reação violenta, procure perguntar o que faltou. Reconheça que se alguém chegou ao ponto de te demitir é porque falta alguma coisa. Se o gestor for sem-noção ele não vai saber responder, e aí a culpa não é sua, é incompetência dele. Se ele te responder com clareza, é hora de aproveitar esse conselho pra melhorar.

Enfim, como dito, este momento não é fácil pra ninguém. Mas procure encará-lo com a frieza profissional que condiz com o esperado, e o momento pode te proporcionar um grande crescimento. Nunca se esqueça de que o mundo gira, e que sempre existe oportunidade para quem tem objetivos e trabalha direito.

Autor

Trabalho na área de tecnologia há 12 anos, tendo sempre um perfil generalista, atuando desde o levantamento de requisitos, passando por análise de sistemas, desenvolvimento, implantação e fazendo acompanhamento pós-venda. Atualmente me dedico à liderança e coordenação de equipes de desenvolvimento, procurando sempre extrair o máximo de cada um e aplicando seus talentos para que todos saiam satisfeitos. Acredito que não exista um profissional cujos talentos não possam ser aproveitados em algum aspecto de um projeto, basta saber estimulá-lo a isso. LinkedIn: http://br.linkedin.com/in/ibovolini

Israel Bovolini Jr

Comentários

1 Comment

  • Li seu texto e achei muito pertinente as colocações… Realmente agir com sensatez quando se é demitido é a melhor dica… Todavia a um porém quando o gestor… Que é fraquíssimo e sem perfil mínimo de liderança… Sabe aquele excelente especialista em algo é promovido como gestor e vira um asno que não sabe nem o que comeu no almoço… Então quando é uma figura assim que demite o que pensar? Como reagir? Ainda mais quando você é pego de surpresa e recebe a justificativa que seu desempenho é ótimo mas o sua postura me atrapalha … Você tem habilidades das quais não tenho e isso pode me prejudicar… Isso é fato verídico… Aconteceu… Como reagir à situação .. O energúmeno (como disse você ) ainda permanece… Mediante puxa saquismos e afins…. E esse é o retrato de uma demissão desastrosa pelo menos para o pseudo gestor….

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