Um dos participantes fez um comentário interessante conceitualmente, porém falho quando olhado de uma maneira clínica, sobre as razões que levam a área de TI a ser vista como é e, consequentemente, ser tratada da forma como vemos atualmente.
Na opinião do participante em questão, a TI precisa evoluir porque a área e os profissionais ainda não entenderam que devem atuar de forma alinhada ao negócio das empresas e esse mesmo participante também acha absurdo alguém de TI sugerir uma formação posterior em Tecnologia da Informação para profissionais de outras áreas.
A minha discordância com essa forma de ver TI ocorre pelo fato de a área ter evoluído muito nos últimos anos e porque a tão criticada falta de alinhamento ao negócio e de integração com outros departamentos é gerada por deficiências não apenas em TI, mas também nas demais áreas das.
Atualmente, ainda existe uma quantidade absurda de empresas cujos processos operacionais e de negócio não funcionam – justificando o surgimento e a popularização dos inúmeros frameworks para as mais diversas áreas dentro das corporações – e a resolução desse tipo de questão não é algo a ser encabeçado pela área de TI. Achar que a TI deve resolver problemas dessa natureza usando tecnologia é, ironicamente, colocar a área em um pedestal que muitos dizem ser o lugar onde os profissionais do setor vivem e do qual devem descer.
Todo profissional de TI com alguma experiência sabe que se processos problemáticos não funcionam sem tecnologia, eles continuarão não funcionando ao serem absorvidos por soluções tecnológicas e essa é uma questão ainda não compreendida pela maioria das empresas e por quase todos os profissionais do mercado, inclusive de TI. Se algo com problemas estruturais ou de concepção é automatizado com primor, as únicas coisas obtidas serão erros primorosamente cometidos e com muito mais velocidade.
Ver, erroneamente, a TI e os respectivos profissionais como uma panaceia é uma das questões centrais da discussão sobre o papel da área nas empresas, mas tal discussão – primordial e necessária para ajudar a melhorar a qualidade geral do país – acaba sendo tratada de maneira superficial ou distorcida pela maioria e tem como uma das consequências a propagação de um discurso de falta de mão de obra qualificada que é exagerado, desproporcional e enraizado em uma falsa premissa de unilateralidade de causa.
Esses mesmos atores que propagam a falta de mão de obra qualificada em TI não trazem para a discussão a falta de profissionais qualificados em todas as demais áreas do conhecimento, demandantes dos profissionais de TI e, muitas vezes, autores de barbaridades empresariais cujos resultados moldam o cenário corporativo deficiente no qual a TI está inserida de forma quase onipresente.
Nota-se vir ganhando força um discurso de que a área e os profissionais de TI precisam ser especialistas em tecnologia e ainda devem resolver problemas de áreas fora do seu escopo. Será que esse é o verdadeiro escopo ou função de TI? Não estaria esse discurso ecoando com força cada vez maior porque os especialistas de diversas áreas do conhecimento não estão mais conseguindo desenvolver processos e soluções corporativas que funcionem e, diante disso, depositam as esperanças na tecnologia e nos profissionais que a conhecem?
Acredito que a área de TI tenha a obrigação de ser especialista em TI e de conhecer, mas não de ser especialista, inclusive com anos de experiência, em processos ou áreas de negócio. Sendo especialistas em TI e conhecendo as áreas de negócio, os profissionais poderão atuar dentro do escopo de TI e, de uma forma crítica junto com os reais especialistas das áreas, serão capazes de dimensionar soluções que de fato resolvam os problemas das corporações, minimizando os riscos da automatização de algo mal desenhado ou que não faça sentido do ponto de vista operacional ou empresarial e ainda, derrubando o mito de que a área de TI é corporativamente estanque.
Entretanto, essa realidade ainda é incipiente e hoje são crescentes as exigências para que especialistas em TI também sejam especialistas reais e experientes em processo ou áreas de negócio e isso tem potencial para criar um cenário ainda pouco debatido – pelo fato de a questão ser encarada como um problema não pertencente ao horizonte de curto prazo ou de, na maioria dos casos, nem ser encarada como um problema – que é o do sucateamento de áreas do conhecimento.
Se usando TI e profissionais de TI especialistas em processo ou áreas de negócio for possível resolver os problemas de outras áreas do conhecimento sem demandar profissionais das mesmas, qual será a atratividade delas como profissão no futuro?
Parece que pouquíssimos pararam para pensar na possibilidade de, dentro de poucas décadas, termos uma situação perfeitamente evitável de desemprego em larga escala dos profissionais das áreas administrativas das empresas em função da substituição da maioria deles por soluções tecnológicas.
Quando tal cenário se tornar realidade – e ele vai se tornar em função do modo como o mercado de trabalho e os profissionais vêm sendo tratados – será que ainda vai existir alguém achando um absurdo um profissional de TI sugerir uma formação complementar em Tecnologia da Informação aos profissionais de quaisquer outras áreas?
Nesse texto as considerações trataram apenas de processos de negócio sendo cada vez mais absorvidos por TI, mas o raciocínio pode ser aplicado em qualquer outro cenário de qualquer outra área do conhecimento, seja em pequena ou em larga escala.
[Crédito da Imagem: Tecnologia – ShutterStock]
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