Surgiram alguns temas e, ao final, depois de muita reflexão, escolhi este: “Tecnologia demais ou humanidade de menos?”, tendo em vista que, coincidentemente, há algo relacionado a um dos capítulos do livro que acabei de escrever (em fase de revisão) e, justamente, remete a uma situação real, enfrentada por mim no passado, envolvendo tecnologia. Como Arquiteto de Software, cargo que ocupo atualmente em uma grande corporação no Brasil, eu poderia dissecar alguns assuntos bastante técnicos que para muitos seria bastante cansativo, já para outros um verdadeiro elixir dos Deuses. Mas como eu penso um pouquinho diferente da maioria dos profissionais da área, acredito que o mais indicado é encontrarmos o ponto de equilíbrio, fugindo um pouco do convencionalismo técnico e partindo para o lado humano que, sinceramente, acredito ser a parcela que realmente importa. Afinal, não estamos produzindo toneladas de códigos, arquitetando ou projetando softwares para robôs, mas para gente de carne e osso. Visualizo a computação como um meio extraordinário para conseguirmos atingir sonhos da humanidade que, muitas vezes, parecem ter saído de filme de ficção cientifica, mas também enxergo um meio de conectar pessoas, ser um facilitador na vida da sociedade moderna, no entanto, acredito que atualmente já se vê exageros e não são poucos que culminam em um fator que particularmente considero perigoso, como a tecnologia como causadora do afastamento entre as pessoas.
Em uma de minhas viagens a Londres, mais especificamente no bairro de Piccadilly, um centro comercial bastante movimentado, pessoas correndo de um lado para o outro, desesperadas, carregando sacolas cheias de compras e de olho em liquidações vez ou outra praticadas em lojas famosas de grife. Neste cenário, entrei em um supermercado não muito grande e fiz algumas compras para consumir mais tarde no hotel. Alguns lanches e guloseimas britânicas (depois escrevo um artigo com algumas dicas). Ao chegar na fila do caixa eletrônico (lá também há filas, não é coisa só do Brasil) percebi que não havia pessoas atendendo e, para a minha surpresa (olhei duas vezes para confirmar se era mesmo aquilo que eu estava vendo), logo estava eu na frente de um “caixa-robô”, com uma tela de LCD semelhante a um caixa eletrônico de banco, e, finalmente, sacolas mecanicamente abertas ao lado para inserir as compras. Eu observei aquela máquina criteriosamente e com um olhar tecnológico. Achei uma maravilha, já imaginei qual aplicação distribuída estava rodando ali naquele momento, projetei na mente as inúmeras formas de transmissão de dados e interações com o servidor, e identifiquei que existiam pontos falhos de segurança na transação, pois contava muito com a honestidade do cidadão no momento da compra, ao passar os produtos corretamente no leitor ótico. Você provavelmente pensou a mesma coisa que eu: Imagine aqui no Brasil, como seria? Bom, continuando… Terminada a compra, inseri as cédulas da caríssima Libra Esterlina (Pound) dentro da máquina e em seguida recebi troco, nota fiscal e o gélido “Thank You”, numa voz abafada e mecânica, parecida aquelas vozes de cancelas de Shopping Centers, nos estacionamentos, que mal conseguimos interpretar.
Aonde quero chegar com esta minha curta descrição do episódio e do meu contato com o robô? É exatamente o fato de estar havendo, silenciosa e gradativamente, uma substituição cada vez mais acelerada de seres humanos por máquinas. Para alguns, uma excelente caminho. Temos um exemplo histórico com a Revolução Industrial que catapultou a sociedade para novos horizontes, realmente é algo bastante polêmico, mas minha abordagem baseia-se mais no lado humano do que do ponto de vista econômico. Como desenvolvedor de software, achei uma solução extraordinária; acredito que se consultarmos 100 programadores, os 100 dirão com firmeza e veemência que é uma ideia fantástica e que adorariam ver as linhas de código do software desenhado para aquela máquina. Mas os 100 desenvolvedores certamente esqueceriam de algo essencial, ao pensar apenas na solução técnica. Ou seja, no fator humano.
E se um dia alguém não quiser ser atendido pela máquina, se alguém preferisse, ao invés daquele “Thank You” de cancela de estacionamento de Shopping, um bom dia caloroso e um sorriso de um caixa de supermercado em carne e osso? Vou mais além, eu que sou da área tenho dificuldade, às vezes, de operar tantas aplicações complexas e pouco intuitivas de bancos, por exemplo. Imagine um idoso que nasceu na época em que os computadores ainda eram apenas operados e restritos a cientistas? Pergunto-me e pergunto a você, leitor(a), não há tecnologia demais aí e humanidade de menos? A meu ver, sim.
A computação avança em passos largos, para nos trazer soluções que realmente saíram de filmes e literaturas de ficção cientifica. Segundo informações especializadas na área, é garantido que estamos entrando numa era de saltos impressionantes na robótica, inclusive a passos mais largos do que a própria computação. Dessa forma, nós da área de tecnologia temos mais um desafio, uma responsabilidade ímpar, e devemos nos preparar nos policiando ainda mais para que não deixemos a tecnologia adentrar valores tão importantes na vida do ser humano como o diálogo, a convivência, a troca de experiências, o contato físico, o olho-no-olho. No sentido de que, se essa consciência não estiver acompanhando a evolução tecnológica e esta mesma consciência seja deixada no ostracismo por todos os profissionais que compõem e fazem tudo isso acontecer, certamente estaremos também caminhando a passos largos para uma sociedade cada dia mais automatizada, mais tecnológica e, fatalmente, mais solitária e menos humana.
É belíssimo, uma verdadeira obra de arte, construirmos sistemas e soluções fazendo uso de conhecimentos matemáticos avançados, desenharmos e arquitetarmos soluções fazendo uso de conceitos como máquinas de estado. Sim, na minha carreira, tanto dentro como fora do pais, pude apreciar algoritmos extraordinários, dignos de se pendurar em quadros na parede. Mas é bom demais conversar alguns minutos com o senhor Zé da padaria e ainda pedir a ele um “pingado” de brinde, e como é prazeroso interagir com gente de verdade nos caixas de supermercado. Pense nisso, reflita sobre sua responsabilidade tecnológica, procure mais humanidade no seu trabalho e certamente você encontrará. Até a próxima.
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