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Disrupção digital

publicado por Cezar Taurion

Disrupção digitalLi a recente entrevista com o fundador do Instagram. Quando perguntado quem seriam seus concorrentes: ” I don’t look at other tech companies. I look at established industries. Instagram is all about connecting people around the world with real-time information. I think about television. I think about the news industry.” Pois é, mas será que estas industrias estão debatendo a concorrência com Instagram neste momento? A competição muitas vezes está acontecendo fora do radar dos executivos de indústria já estabelecidas…e as vezes são surpreendidos! Este texto me lembrou o que aconteceu com a Kodak. É um exemplo clássico de como a ruptura afeta uma organização. A Kodak era sinônimo de fotografia e em pouco mais de dez anos tornou-se irrelevante. Por volta do ano 2000, quando a fotografia digital estava começando os debates eram sobre a qualidade destas fotos e o alto preço das câmeras. Os especialistas diziam que as câmeras tradicionais ainda durariam de 20 a 50 anos, mas em menos de dez anos simplesmente o mundo digital tomou conta de tudo. As próprias máquinas digitais foram logo depois sobrepujadas pelos smartphones, o que acelerou o processo de queda. Na prática não foi apenas a Kodak que caiu, mas toda uma indústria foi destruída e substituída por outra. Vale a pena ler o texto “The rise and fall of Kodak´s moment”.

O fato é que estamos vivendo um momento de rupturas causadas pela revolução digital. Existe a real possibilidade dos negócios serem “uberizados”, termo relacionado ao app Uber, que está subvertendo o mercado de táxis, e que significa que um belo dia você acorda e vê que sua área tradicional de atuação não existe mais… Muitos usuários de TI questionam porque os sistemas corporativos não são tão intuitivos e fáceis de usar quanto os apps em seus smartphones. Porque tem que utilizar tecnologias mais antigas que as que usam em suas próprias casas? Os clientes perguntam porque sua experiência de interação com a empresa é tão burocrática e inflexível.

Entrar no mundo digital, tornar-se uma empresa que “pensa digital” não é questão de opção, mas de sobrevivência. Um recente estudo publicado pela HBR (Harvard Business Review) “The Digital Dividend: First-Mover Advantage” mostrou uma nítida correlação entre as empresas que mais rapidamente adotam novas tecnologias e melhores resultados nos negócios. Estes “IT Pioneers” (ou “ bandeirantes digitais”, como disse meu amigo Sergio Mafra), segundo o estudo, adaptam-se mais rapidamente às novas maneiras de fazer negócios, entendem as transformações que a tecnologia provoca e as adotam mais rápido que outras empresas.

Estar no mundo digital significa, entre outras ações, acelerar o processo de digitalização de seus processos de negócio. Não é em absoluto apenas automatizar processos já existentes, mas reinventa-los, cortando etapas, reduzindo documentação e incrementando automação nos processos decisórios. Estes exemplos podem ocorrer em todos os setores de negócio e práticas adotadas por um setor podem ser adotadas por outros. Por exemplo, os processos de self-service das empresas aéreas poderiam ser adotadas pelas empresas de telefonia celular, permitindo que seus usuários pré-pagos possam comprar e ativar seus aparelhos em envolvimento do back-ofice da empresa. Exatamente como é feito na compra e no check-in de uma passagem aérea. Podemos criar um modelo “Amazon like” para ditar os rumos da digitalização nas corporações, incorporando os conceitos similares à que Amazon adota em todas as suas ações. Por exemplo, se eu peço pizza ou localizo um táxi pelo smartphone, porque meu banco não está nele? Ou minha seguradora? Ou minha locadora de veículos? Um banco, por exemplo, pode pensar sim em resolver remotamente e de forma instantânea as demandas de seus correntistas, sem que ele tenha que se deslocar a uma agência.

O grande desafio para digitalização das empresas é, por incrível que pareça, a própria TI. Muitos setores de TI, às voltas com seus sistemas legados, importantes sem dúvida, mas avessos a novidades, se apegam a conceitos arraigados em seus imaginários coletivos. Por exemplo, o mito da insegurança na computação em nuvem. Agarram-se a ideia que o ambiente on-premise é, indubitavelmente, mais seguro. Mas é um mito que simplesmente não tem fundamentos. Não há registros de invasões em nenhum dos grandes provedores, que tem os mais altos e complexos certificados de segurança para armazenar qualquer tipo de dado, seja pessoal, cartão de crédito, dados hospitalares, etc. O fato dos servidores estarem dentro do data center da empresa não significa que seja mais seguro, pois o que garante que realmente seu data center é mais seguro que os dos principais provedores de nuvem? Afinal um pendrive contaminado com vírus Stuxnet foi responsável pelos danos em usinas nucleares iranianas. As usinas não estavam operando em computação em nuvem…

O que precisamos? Reinventar a TI. Não é uma tarefa fácil, pois passa por mudanças em infraestrutura, capacitações e principalmente de cultura e práticas. Não é um projeto de curto prazo, mas levará tempo para se consolidar. Um desafio é manter os legados e implementar as novas plataformas ao mesmo tempo. Uma sugestão é criar uma TI em duas camadas, uma mantendo os sistemas atuais e outra, voltada ao desenvolvimento de apps e iniciativas de Big data, usando conceitos e cultura de startups. São velocidades, práticas, capacitações e culturas diferentes. Se colocarmos as iniciativas de digitalização, suportadas pelas novas plataformas, nos modelos de operação e práticas da TI atual, elas não se desenvolverão. Por outro lado, os sistemas legados, desenvolvidos para processos mais lentos e burocráticos de governança, se colocados de imediato em práticas de entrega contínua, se tornarão ingovernáveis. O processo em duas camadas, com duas velocidades, permite fazer a evolução gradual, ao mesmo tempo que não amarra a iniciativa de digitalização da empresa. Mas é importante que o projeto deve prever a migração progressiva da TI atual para a nova plataforma.

Alguns aspectos são essenciais para que o processo de reinvenção funcione. Primeiro uma visão e comprometimento da alta administração com este processo. TI deve ser “top priority” do CEO e demais C-level da empresa. Segundo uma liderança única, clara e centralizada. Se houver um CIO cuidando do legado e um CDO (Chief Digital Officer) das novas iniciativas, de forma isolada, poderemos ter severos problemas de integração. Afinal para serem realmente disruptoras as apps vão precisar acessar informações que estão sob a guarda dos sistemas legados. Também criar uma apps store própria sem processos adequados de governança poderá levar a proliferação de apps com problemas de instabilidade e segurança. O segredo é criar uma mentalidade startup mas com sólidos princípios de governança corporativa cobrindo as duas TI.

A reinvenção da TI passa necessariamente por uma mudança de mentalidade. É necessáriouma visão de como será o negócio e a organização de TI daqui a 3 ou 5 anos e não apenas ver os objetivos dos próximos meses. O problema é que o novo nem sempre surge com oferta de melhor qualidade que o já existente. Muitas vezes as novidades surgem com qualidade bem inferior, mas ao quebrarem a barreira de aceitação do mercado, criam rupturas. Nós estamos vivenciando um processo de transformação onde o acelerado ritmo de inovação tecnológica e a mudança de hábitos da sociedade causadas por estas inovações transformam negócios estabelecidos. Entender estas mudanças e reinventar a TI para suportar e conduzir estas rupturas nas empresas é essencial para a TI se manter relevante.

[Crédito da Imagem: Disrupção Digital – ShutterStock]

Autor

Cezar Taurion é head de Digital Transformation da Kick Ventures e autor de nove livros sobre Transformação Digital, Inovação, Open Source, Cloud Computing e Big Data.

Cezar Taurion

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