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Roberval, o empreendedor

publicado por Flávio Steffens

Eram 23 horas, de uma quarta-feira. Paulo estava dormindo.

O telefone toca. Era Roberval.

– Paulo! Paulo! Já tá dormindo?

Paulo estava meio atordoado com a situação. Ser acordado por alguém do outro lado da linha, que fala como se estivesse ligado em 220 volts, não é lá muito agradável.

– Hmmm… Não… estava só deitado.

– Que ótimo!!! Seguinte, recebi uma luz de sabedoria. E, a partir de hoje, decidi que vou ser empreendedor. Quer ser meu sócio??!

Paulo deu um pulo da cama. Ele não conhecia muito o Roberval. Tinham amigos em comum, e Paulo o via mais como um conhecido. Sequer sabia o sobrenome de Roberval.

– E aí?!! Topas?!!

– Roberval… que ideia é essa? Por que eu?

– Ora, cara!!! Decidi que cansei dessa vida de empregado. Amanhã estou pedindo demissão do escritório de advocacia e vou começar a tocar minha empresa.

– Legal, Roberval. Boa sorte, na empreitada. O que você vai fazer?

– Ainda não sei bem. Estive conversando com um amigo e ele me disse que o mercado web tá promissor! E parece que há também uma demanda muito grande por projetos envolvendo GPS e celular.

Paulo estava meio atônito.

– Interessante… mas o que tu conheces destas áreas?

– Muito pouco… confesso. Mas, cara!! É aí que tu entras!!

– Hein?

– Tu trabalha com internet há algum tempo, que eu sei. Caaaara! Vamos unir forças!! O mercado tá bombando e a gente precisa demais pegar uma fatia!!

– Roberval, eu não sei ao certo o que tu estás querendo. Já parou para pensar quantas empresas atuam nesse setor de web? E quantos freelancers existem por aí?

– Hmmm… não. Na verdade nem sei muito disso. Eu li uma reportagem no jornal e…

– Cara!! Como tu queres entrar no mercado sem conhecer nada? Só por causa de uma reportagem??

– Ah! Deixa de ser pessimista!

Paulo já começa a ficar impaciente.

– Não é ser pessimista. É colocar um pouco os pés no chão.

– Bom, enfim. Eu tô te convidando, Paulo! A proposta é a seguinte: tu entras para coordenar essa parte de internet e tecnologia, um vizinho meu que tá se formando em design vai cuidar da parte gráfica, um parceirão amigo meu vai ajudar a administrar a empresa e eu vou correr atrás dos projetos e vou tocar a parte jurídica.

– Como é? Tu tá querendo entrar num mercado que tu não conhece muito bem e tá convidando mais TRÊS pessoas? Quer uma empresa com QUATRO sócios?

– Qual é, cara! Isso se chama unir as forças. Pensa bem, cada um focando no que conhece! E mais do que isso, o investimento pra abrir a empresa é dividido por quatro, sacou? Barbada!!

– Olha Roberval… ter um sócio só já é bem complicado. São duas pessoas que tem educação e experiências diferentes. Pessoas que terão visões diferentes para o futuro. Imagina QUATRO pessoas que NÃO SE CONHECEM trabalhando junto em um projeto cujo mercado a maioria deles não entende direito!

– Poxa, Paulo! Eu tô mega empolgado com a ideia! Isso pra mim basta.

– Mas quatro sócios? As despesas  são divididas por quatro. Verdade…

– Viu só??

– … mas Roberval, e qual deve ser o faturamento da empresa para que os quatro sócios tenham um salário ou mesmo um lucro razoável? Porque isso vai ser dividido por QUATRO também. O que tu vai fazer?

– Ah, cara! Isso é DEPOIS!

– Hein?? Depois? E já parou pra pensar em todo poder de barganha que está com os clientes e fornecedores???

– Poder de … barganha? Não quero entrar no mercado público turco!

– Cara, o mercado de TI é promissor, sim. Mas pensa quantas pessoas competem nele. Além disso, os clientes vão barganhar o preço dos serviços pra colocar lá embaixo, pois vai ter gente que vai aceitar isso. Freelancers que trabalham em casa por prazer, e que qualquer 50 reais já é lucro. Fora isso, eu sozinho jamais teria condições de “operacionalizar” qualquer projeto que fosse vantajoso pra gente. Daí contratar gente pagando um salário razoável de mercado.

– Ah cara, barbada. A gente corre atrás de algum empréstimo no banco ou algo do tipo. Contratamos só gente boa, daí!

– Como é?? Tu quer se endividar no banco??

– Lógico, cara! Tudo dividido por quatro, sacou? Óbvio que pensei nisso só por causa disso.

– Roberval… só por curiosidade. Tu já leu algum livro de estratégia, gestão ou empreendedorismo? Fez algum curso sobre isso?

– Não. Odeio ler. Mas atualmente tô lendo “Pai rico, pai pobre”. E fora isso, conversa com quem tu quiser, Paulo: tu vai ver que todos vão dizer que só se fica rico sendo dono de empresa.

– Empreender não é se aventurar assim, cara. Ainda mais no Brasil.

– Ah, cara. Estamos em outros tempos…. ah, não vou ficar perdendo meu tempo. Paulo! Valeu pela atenção… achei que tu ia se motivar mais com a ideia. Vou procurar uma outra pessoa. Acho que realmente tu não tem o perfil de empreendedor. Tchau!

Se despediram e desligaram.

Paulo não acreditava no que havia ouvido. Teve um calafrio ao tentar se imaginar aceitando a oferta.

Roberval recém havia desligado o telefone, e lembrou de um amigo da praia, que trabalhava com programação. E que gostava de internet. Resolveu ligar para ele.

Autor

Flávio Steffens de Castro é empreendedor na Woompa (www.woompa.com.br), criador do crowdfunding Bicharia (www.bicharia.com.br) e gerente de projetos desde 2006. Trabalha com métodos ágeis de gerenciamento de projetos desde 2007, sendo CSM e autor do blog Agileway (www.agileway.com.br).

Flávio Steffens

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