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O Dilema Águia/Galinha na TI

publicado por Marco Aurélio Sorpilli

Para quem não conhece o livro “A Águia e a Galinha”, escrito por Leonardo Boff, teólogo, escritor e professor de renome, farei um resumo introdutório a este artigo.

Certo dia um camponês encontrou na floresta um filhote de águia ferido. Levou-o para sua fazenda, tratou suas feridas e passou a criar o filhote junto com suas galinhas, como sendo uma delas. Passados cinco anos, a águia agia como uma galinha, ciscava, fazia pequenos voos rasantes, enfim, utilizando o “tecniquês” da área de tecnologia, era um hardware de águia com um software de galinha.  Assim durante uma visita de um amigo naturista ao camponês, ele desafiou o camponês a testar o instinto da águia, defendendo que não importa em que ambiente ela tenha sido criada, o instinto de águia teria adormecido, mas não morrido. Bastava desafiá-la que automaticamente ocorreria o “upgrade” de galinha para águia. Pois bem, seguiram testes lançando a águia ao ar, de cima de um telhado, e nada. Ela agia como uma verdadeira galinha, dando rasantes, voltando ao solo. Enfim, resolvem segurar a águia contra o sol, para que observe o seu ambiente natural, e soltaram-na do alto de um penhasco. Guiada pela luz do sol, e envolta pela liberdade, ela bateu suas asas até desaparecer no horizonte. Enfim, o naturista estava certo, a águia estava adormecida, mas os seus instintos a guiaram para a sua liberdade.

Enfim, você agora deve se perguntar o que isso tem a ver com gestão de TI. Bom, vamos ao que interessa.

Nossas áreas de TI nas empresas estão repletas de técnicos e analistas “águias”. Aqueles que utilizando de suas asas alçam altos voos, que não veem limites, que partem para o horizonte em busca de novos desafios a cada dia, deixando para trás tudo que o prende e tolhe sua liberdade, assim preservando sua autonomia e independência. Por outro lado temos também os técnicos e analistas “galinhas”. Esses por sua vez se mantem ao nível do chão ignorando suas asas, mantendo seus pés em terra firme, ciscando e fazendo voos rasantes, mas sem nunca sair do seu “terreiro”, o que lhe poda a liberdade e em troca lhe dá a segurança que julga necessária. Enfim, são os exemplos extremos, mas bem definidos os perfis que tratamos acima.

Porém, quero focar no perfil mais rico a ser trabalhado pelos gestores, um perfil com potencial, porém se mal trabalhado, há o risco de se subutilizar a capacidade produtiva e torna-lo refém de si mesmo e do ambiente que o cerca. Trata-se do perfil “águia-galinha”, ou seja, as águias que vivem presas em rotinas de galinhas, agindo e vivendo como se fosse uma galinha. Ciscando e bicando o chão e alçando pequenos rasantes aqui e acolá. “Que mal há nisso”, você me pergunta agora. Nenhum, eu respondo, nenhum se não estivéssemos tratando de uma águia, e consequentemente de um total desperdício potencial. Lembremos aqui das palavras célebres da admirável Carlos Drummond de Andrade: “A cada dia que vivo mais me convenço de que o desperdício da vida está no amor que não damos, nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca e que, esquivando-nos do sofrimento, perdemos também a felicidade. A dor é inevitável. O sofrimento é opcional”. Assim sendo, porque desperdiçar os dons que temos como águias, vivendo vidas de galinhas? Não seremos boas galinhas, nem tão pouco boas águias.

Mas o que podemos fazer para mudar esse paradigma? Neste ponto que entra a figura do gestor, como líder e não apenas como chefe. Um paradigma antigo, mas ainda muito presente na área de TI.

Podemos ser gestores “camponeses”, mantendo águias ciscando em nossos terreiros, com lindas asas de longa envergadura, utilizadas para rasantes ate o poleiro, com seus bicos pontiagudos e resistentes, utilizados para bicar migalhas no chão, e com suas garras afiadas e precisas, utilizadas para caminhar e ciscar. Assim teremos um belo terreiro com várias águias, cujos ovos não nos servem de refeição, tampouco sua carne é agradável ao paladar, para um assado ou ensopado. Um terreiro belo, mas pouco produtivo, afinal, não é pra isso que as águias existem. São como os departamentos repletos de profissionais brilhantes executando rotinas monótonas e maçantes, mecanizadas sem nenhum desafio.

Porém se quisermos mudar realmente o cenário aproveitando o seu potencial, devemos agir como líderes “naturistas”. Você deve me perguntar novamente: Como assim? Explico: devemos primeiro pôr a testes suas potencialidades e instintos dos águias-galinhas. Alçando-os acima, soltando-os de telhados, oferecendo desafios para instigar seus primitivos instintos de águias. Assim, podemos também segurá-los acima frente ao sol, mostrando-o seu guia. Metaforicamente aqui, mostramos os objetivos e horizontes, oferecemos o desafio, mas mostramos a recompensa, indicando o caminho. E não se trata de um obedece-ganha, mas de uma relação mérito-recompensa. Somente assim podemos extrair o melhor dos nossos liderados, em uma relação “ganha-ganha”.

Muitos gestores sabem disso, mas não aplicam, tornando-se “camponeses” com potencial para “naturistas”. Tem instinto, mas não tem ação. Como o analista “águia-galinha” é uma águia, sabe que é instintivamente, mas é levado a agir como galinha. Afinal, porque ser diferente? A resposta mais óbvia seria: “Para ser VOCÊ MESMO”.

Mas não é tão fácil como parece. Nesta jornada, alguns “águias-galinhas” estão com seu lado galinha tão entranhados em si, que não mais querem sair desta condição. É uma opção, mas devemos antes dar-lhes a oportunidade de serem o que são. O livre-arbítrio nos obriga a respeitar a sua decisão, afinal é sobre si mesmo que reflete esta deliberação.

Mas podemos dizer que vale a pena insistir, já que isso nos torna um facilitador, e no caso da TI, como gestores colhem os frutos de despertar as águias para voos mais distantes. E ainda podemos contar com o reconhecimento e gratidão dessas águias pelo curso de suas carreiras afora. E como nossa vida é baseada em relacionamentos, com certeza quem instiga esses potencias, tem retorno garantido em suas vidas. “És eternamente responsável por aquilo que cativas”, diria Saint-Exupery em sua obra “O Pequeno Príncipe”.

Enfim, quero concluir aqui, que às vezes, precisamos de um norte para usufruir de nossos potenciais, precisamos de uma fagulha, um incentivo para segui-los. E pela dualidade da natureza dos relacionamentos, que se apresentam em mão-dupla, também devemos ser a fagulha, ser o líder que se apresenta como fomentador de transformações, de mudanças. Se soubermos liberar as águias dos nossos convivas, sejam eles subordinados ou não, teremos parte de nossas missões cumpridas com louvor, e podemos nos preparar para colhermos os frutos dessa ação.

Referência Bibliográfica:

BOFF, Leonardo. A águia e a galinha, a metáfora da condição humana. 40 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1997.

Autor

Administrador por formação, atuando na área de Tecnologia da Informação como Coordenador de Sistemas no Grupo Frialto, empresa do ramo frigorífico com atuações em outros setores estratégicos. Estudioso das áreas de TI e Relações Humanas.

Marco Aurélio Sorpilli

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