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As cláusulas de confidencialidade e não concorrência no Direito Brasileiro

publicado por Marcele Adames

Figura -  As cláusulas de confidencialidade e não concorrência no Direito BrasileiroUma das principais preocupações atuais das empresas brasileiras de TI é como preservar seu maior ativo: a informação. Desde situações cotidianas como o afastamento de um funcionário que tenha participado de um projeto inovador ou que conheça diretamente os clientes da empresa até a possibilidade de associação entre duas empresas do mesmo ramo, a preocupação é sempre a mesma: como garantir que os segredos comerciais das empresas de TI não sejam indevidamente apropriados pelos concorrentes.

Hoje, principalmente nas empresas de TI, o conhecimento, a propriedade intelectual e a confiança dos clientes no know how são ativos mais valiosos que os próprios bens físicos, tais como a sede, os equipamentos e capital financeiro. O papel da informação, do know how e, principalmente, o valor que representa uma inovação no mercado de TI são suficientes para justificar a inquietação das empresas em salvaguardar esses ativos.

Justamente para preservar o investimento das empresas no seu principal ativo – o conhecimento e a informação – é que se desenvolveram mecanismos jurídicos que, bem elaborados, têm o condão de neutralizar eventuais efeitos nefastos que a utilização indevida de tais conhecimentos e/ou informações pudessem causar. São as chamadas cláusulas de confidencialidade e não concorrência, que têm aplicabilidade tanto em situações simples como o desligamento de um funcionário até outras mais complexas como a formação de consórcios, joint ventures, fusões e aquisições.

As relações empresariais nos EUA são comumente permeadas por essas cláusulas e lá as obrigações de não fazer decorrentes do dever de confidencialidade e de não concorrência são vistas com naturalidade. Também a jurisprudência dos tribunais norte-americanos é rica em casos de processos judiciais determinando a observância do dever de sigilo e de não concorrência. Vale citar um caso que na época foi bastante noticiado pela imprensa internacional: A IBM ingressou com um processo judicial contra seu ex-vice Presidente Mark Papermaster que havia aceitado assumir cargo na concorrente Apple. A decisão juiz Kenneth Karas ordenou que Papermaster deixasse a Apple, sob o argumento de que sua experiência anterior em design de processadores da IBM poderia ser desempenhada no novo emprego e que apesar de não haver prova de que Papermaster tenha divulgado informações confidenciais da IBM, a verdade é que poderia prejudicar seu antigo empregador. Decisões como esta reforçam o papel que exercem as cláusulas de confidencialidade e de não concorrência nos EUA.

As empresas brasileiras ainda temem e olham com receio as cláusulas de confidencialidade e de não concorrência, como se ainda duvidassem da sua aplicabilidade no Brasil. Contudo, é importante referir que, bem redigidas do ponto de vista jurídico, conforme cada caso específico, tais cláusulas são instrumentos jurídicos válidos e reconhecidos no ordenamento jurídico brasileiro e não raras vezes os tribunais têm proferido decisões acertadas resguardando a confidencialidade, a informação, a propriedade intelectual e o dever de não concorrência. E não faltam exemplos bem sucedidos de aplicação efetiva de tais cláusulas de confidencialidade e não concorrência. Por exemplo, muito embora o regime de proteção ao trabalhador, para as relações de trabalho é possível estabelecer com o empregado as cláusulas de confidencialidade e de não concorrência, dentro de limites e parâmetros que impliquem em obrigações mútuas consideradas razoáveis. Para ilustrar essa possibilidade, valemo-nos da definição de não concorrência trazida por Orlando Gomes: “é a obrigação em virtude da qual o empregado se compromete, mediante remuneração, a não praticar, por conta própria ou alheia, após a vigência do contrato de trabalho, dentro de limites de objeto, tempo e espaço, ação que implique desvio de clientela de seu empregador, sob pena de responder por perdas e danos.”

Reconhecendo a validade das cláusulas de confidencialidade e não concorrência nos contratos de trabalho, citamos precedente do Tribunal Superior do Trabalho:

SEGREDO INDUSTRIAL. COMPROMISSO DE NÃO DIVULGAR. LEGALIDADE

  1. É vedado ao empregado divulgar o segredo da empresa (a lei não estabelece prazo para essa vedação); se o empregado divulgar comete falta grave. A proibição alcança o ex-empregado, visto que a rescisão do contrato de trabalho não transfere a este o direito de divulgar, explorar ou comercializar a fórmula industrial de que teve conhecimento, ainda que passe a trabalhar para empresa concorrente.
  2. O ajuste consistente no compromisso firmado pelo reclamante de não divulgar, não explorar e não utilizar o segredo da fórmula do produto industrial de que tem conhecimento guarda perfeita sintonia com o disposto no art. 195, inc. XI, da Lei 9.279/1996. Recurso de Revista de que se conhece e a que se dá provimento.
    Processo: RR – 153300-21.2001.5.15.0093 Data de Julgamento: 24/09/2008, Redator Ministro: João Batista Brito Pereira, 5ª Turma, Data de Divulgação: DEJT 12/12/2008.

Cita-se, de outro lado, casos de franquias nos quais haja necessária transferência de tecnologia e informação para o franqueado. Nessas hipóteses, quando há o fim do contrato, é possível estabelecer que o franqueado se abstenha de utilizar a informação obtida através daquele contrato em seu favor ou de terceiro, ou mesmo que não possa exercer a mesma atividade por determinado tempo, garantindo que não venha a concorrer com o franqueador utilizando-se do conhecimento que adquiriu em razão do contrato de franquia.
Assim como no direito do trabalho e nas franquias, também em casos de aproximação entre empresas do mesmo ramo, inicialmente concorrentes, é possível estabelecer cláusulas de confidencialidade e não concorrência. Nesses casos, ainda mais tranquilamente os tribunais têm reconhecido o dever de abstenção e de sigilo. São as hipóteses em que duas ou mais empresas, pretendendo uma atuação conjunta no mercado, iniciam um processo de aproximação e de troca de informações confidenciais.

É imprescindível, porém, que as partes assinem termo prévio contendo a obrigação de confidencialidade e de não concorrência, bem como as hipóteses de incidência e abrangência de tais cláusulas restritivas, condição indispensável para a segurança das empresas envolvidas no processo. Isso porque, se descumprida obrigação de sigilo e de não concorrência, terá a empresa lesada condições de exigir judicialmente tanto a paralisação da atividade desenvolvida com base nas informações que lhe pertencem quanto a fixação de indenização correspondente às perdas e danos.

Autor

Graduada em Ciências Jurídicas e Sociais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUC-RS (2005). Especialista em Direito Tributário pela Universidade do Sul de Santa Catarina – Unisul (2008). Advogada sócia de Franco Advogados.

Marcele Adames

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